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terça-feira, 22 de junho de 2010

KILUANJI KIA HENDA

KILUANJI KIA HENDA
Identificação
Nome Kiluanji Kia Henda
Data de nascimento 1979
Naturalidade Luanda
País Angola

M/F M
Morada Luanda - Angola
Telemóvel +244-912 247 700 / +351 96 920 84 08
E-mail kiahenda@gmail.com

Website osinternacionalistas.blogspot.com


Formação
Autodidacta.
2001 - Participou em workshop de Video Documental com Ivo Ferreira, Luanda.
Técnicas
Fotografia
Video
Música
Fotografia / Video

Tipologia
Arte contemporânea / Fotografia, Video, Cinema

Identificação
Artista

Actividade profissional
Tem colaborado na produção de eventos, na área de vídeo, luminotécnica e som.
Exerce a sua actividade apenas como artista.

A desmedida de Kiluanji Kia Henda - da Trienal de Guangzu à Experimenta Design: dois projectos
Kiluanji Kia Henda tem vindo a expor internacionalmente – de Guangzhou à Cidade do Cabo, de Nairobi a Veneza - o que desvincula o seu trabalho de uma legitimação que passaria exclusivamente pelas capitais da arte contemporânea do Ocidente. Outro dos traços singulares do seu percurso é que até agora, a apresentação do seu trabalho não tem passado pela legitimação no “pequeno” mundo da “ex-metrópole”, Lisboa. Enquanto artista de nacionalidade angolana, e portanto, de um país hoje independente, o seu art world’s tem estado alheio a um conjunto de políticas culturais que têm a língua portuguesa como ligação, e que insistem em mostrar a arte e respectivos artistas em circuito fechado, itinerando pelas ex-colónias e a ex-metrópole.
Em Portugal, Kiluanji Kia Henda expos uma única vez e fora dos centros habituais, “Ngola Bar” no Centro de Artes de Sines (2007). Traz agora a Lisboa, a propósito da Experimenta Design 09 e da exposição “Luanda: Anatomia da Velocidade”, um novo projecto (“Transit” e “Un recuerdo para ti”, 2009).
Propomos, desta forma, fazer a leitura de uma das fotografias que Kiluanji traz a Lisboa – “Transit” – a par da foto-instalação “Icarus 13” apresentada na Trienal de Guangzhou em 2008, na China. Em ambos os projectos sugere-se um olhar quer do colonialismo, como do pós-colonialismo em África. Mas aquilo que suscita a leitura que se segue, é que ao procurar rever a história, vem-se a perceber que “toda a história como reconstrução do passado é, obviamente, um mito”1 (Jan Vansina).
Icarus chega ao sol
O projecto Icarus 13, seleccionado por Stina Edblom, research-curator para a Trienal de Guangzhou “Farewell to Postcolonialism”2, apresenta a primeira viagem espacial realizada ao Sol, protagonizada por uma missão angolana. Trata-se de uma instalação - oito fotografias e uma maqueta da nave – que documenta todos preparativos para a descolagem: desde as últimas revisões da maquinaria, a equipa de trabalhadores, uma vista geral do estaleiro, até aos feixes de luz da nave. O texto que acompanha este trabalho, deliberadamente anónimo, termina com um “to be continued” e deixa em aberto o desenrolar da missão.
Tal como a própria instalação explicita ostensivamente, a missão Icarus 13 não existiu históricamente, e os trabalhadores que vemos nas fotografias jamais afinaram os motores da nave. Desta forma, Icarus 13 fabrica uma perplexidade com gozo e ironia. O efeito que provoca tem uma intensidade e natureza antropológicas, ou seja, mistura episódios históricos, políticos ou mesmo mitológicos, também presentes nas narrativas utópicas. Icarus 13 evoca de forma imediata o anti-herói grego que perde as asas no momento em que se aproxima do Sol, ao mesmo tempo que retoma inteligente as piadas ao jeito de Samora Machel que provocavam a gargalhada geral na audiência: “os africanos iriam chegar ao Sol, mas tinha de ser de noite para não se queimarem”. Para lá do irrisório da imagem, estabelece-se, portanto, uma ponte entre o mito e o cómico.
A vida que anima a instalação Icarus 13 é a vida que subtilmente se insinua nos intervalos de significação a que se prestam as imagens, quando cuidadosamente seleccionadas e montadas. Assim, a instalação oscila entre a ficção expressa (a missão solar) e a realidade, mas uma realidade composta tanto por posicionamentos político-civilizacionais (a piada de Machel, que pode ser interpretada como a proximidade/distanciamento de África vis à vis o Ocidente) como por reminiscências clássicas (Ícaro), mas ainda uma realidade profundamente enraizada no quotidiano, intrinsecamente prosaica e, por fim, a realidade artística em que, fatalmente, a obra artística se insere.
Os trabalhadores que em Icarus 13 afinam a maquinaria da nave são, afinal, trabalhadores da construção civil de Luanda que Kiluanji fotografou durante incursões de trabalho. Icarus 13 “é” um mausoléu inacabado deixado pelos russos em Angola, onde consta repousar o corpo de Agostinho Neto. O que se apresenta como “Observatório de Astronomia”, por exemplo, “é” um cinema na região do Namibe que a descolonização deixou inacabado. As luzes da descolagem da nave “são” imagens captadas durante os festejos da ida da selecção angolana “Palancas Negras” à Copa do Mundo de 2006, etc.3
Kia Henda dispara em várias direcções e coloca-se no centro de um campo especulativo calibrado com a sinopse da instalação que diz: “As a ball of fire this odyssey to the Sun needed imagination as its fuel”, onde se compara a imaginação a um músculo que trabalha na contínua redisposição das imagens, entre a ficção e a realidade.
Efectivamente, Icarus 13 baralha a história, “desafina” o passado colonial, os estereótipos africanos e a desmedida imperialista, mas o interesse deste “programa”, aquilo que o torna destabilizador é o facto de operar no terreno vacilante que vai do documento à ficção, uma das questões centrais da pesquisa contemporânea.
Entre nós, Kiluanji Kia Henda expôs unicamente no Centro de Artes de Sines (“Ngola Bar”, 2007), tendo vindo a afirmar um percurso internacional (Bienal de Veneza, Trienal de Guangzhou, ARCO, Joanesburgo, Nairobi, São Paulo, etc), que desvincula a habitual recepção (e sagração) do trabalho de artistas africanos do circuito artístico referente à ex-colónia e à ex-metrópole. A sua fotografia estabelece a dois tempos o registo das presenças do mito na paisagem (o pós-colonialismo em África) e, mais recentemente, a encenação das grandes narrativas da humanidade e das suas expressões: a demanda, a aspiração, a ancestralidade, a transformação/travestismo, a velhice, a creolização, etc.

FOTOS DA EXPOSIÇÃO iCARUS 13: http://www.artecapital.net/perspectivas.php?ref=101

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